- Olha, - eu falo - diz ou te calo.
Tomo um trago.
Eu ainda estava calmo.
- Traz a venda, está na dispensa.
Ordens são meu forte, sempre foram.
Dar ordens é uma Arte!
Tu ficas na descrença, já sentiste a minha presença.
- Põe.
Agora não vês.
Silêncio.
Chego próximo do teu rosto medroso e, agora, cego.
- Anda, explica, porra! - eu, aos gritos.
Gritar também é uma arte. Ou você sabe gritar, ou parece uma bicha medrosa.
E tem certas coisas que me embrulham o estômago, por isso sei gritar: para não sofrer com a possibilidade de sentir nojo de mim mesmo.
Eu ainda estava calmo.
Silêncio.
Tomo um trago.
Silêncio.
Trago.
Mas estava perdendo a paciência. Queria ir ver minha mulher, e rápido.
- Estou perdendo a paciência - disse para o coitado.
Ele não tinha culpa.
Tinha? Não sei. Eu tenho.
Eu tenho culpa.
Meu pai tem culpa.
Minha mãe não, sempre me pediu para estudar, ser um médico ou dentista talvez.
Meu pai me queria lutando pelo nosso país, então assim o fiz.
Lutei, e acabei aqui.
Minha mulher quer um filho e uma filha, mas já não garanto que quer de mim.
Não quero filhos para morrer pela paz - sendo que eles próprios não estão em paz.
Talvez seja por isso que eu lute. Talvez eu só queira que meus filhos não lutem. Talvez eu queira os filhos. Talvez eu queira que um seja dentista e a outra seja médica. Ou ao contrário, não sei.
Mas, antes, precisava da minha mulher.
Silêncio.
Talvez ele não tenha culpa.
Silêncio.
- Me tortura, mas não me culpa! - ele falou.
"Estranho", pensei.
- A dor não expia a culpa da tua consciência - eu disse.
Não sei porque, escapou.
Meus soldados não entenderam, o Padre presente não entendeu.
E o homem começou a chorar. Então arranquei-lhe as vendas.
Não tenho nada contra homens que choram, mas devem saber chorar. E ele sabia.
Seu rosto estava contraído, seus olhos raivosos.
Suas mãos cerradas.
- Eu... não... tenho... Culpa!
Me olhou com firmeza. Tinha bons olhos.
- Sumam com ele - ordenei. Nada entrará em sua ficha, seu nome será apagado. Nada sobrará, nem papéis, nem ossos.
Nem soldados, nem Padre entenderam.
Não foram feitos para entender.
Foram feitos para receberem ordens. E quem dava as ordens?
Silêncio.
Tomei outro trago.
Quem dava as ordens, hein?
Exato.
Silêncio.
O homem voltou a chorar, mas sem soltar um pio.
Estava aliviado.
E eu iria, então, ver minha mulher.
"Dia esclarecedor", pensei.
Um comentário:
"Gritar também é uma arte. Ou você sabe gritar, ou parece uma bicha medrosa."
Putz....que merda o.o
XD
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