sábado, 28 de maio de 2011

E assim terminariam as Falsas Biografias Cotidianas.

Desde então mudei de nome, mudei de endereço algumas vezes; mudei o argumento do que venho dizendo incessantemente e até mesmo o destino eu supus ter alterado algumas absurdas vezes.
Deixei-lhe a carta de despedida e tentei com todas as forças deixar junto daquela casa teu rosto. E não vou mentir que alguns dias eu cheguei a concluir que eu havia sido um homem de sucesso em minhas tentativas. Aí me frustrava, lutava e mudava mais uma vez o argumento, o destino, o rosto.
Isto não é para te dizer nada, é para dizer para mim - pois preciso sim disto - que consegui.
Mais uma vez, diferente de antes, repito:
eu fiz!
EU FIZ!
A única alteração é que não sou mais menino ingênuo para terminar com um mero: "e que não me rime com fim". Todas as grandes decisões aprendi que também vem munidas de Adeus.
Aprendi a teoria, é claro.
Deixei a nossa cidade, a que aprendi a chamar de minha, a que ironicamente se chamava Saudade, faz um bom tempo. Quanto? Ambos sabemos. Ou ao menos eu sei perfeitamente, e só não digo quantas horas por minha péssima habilidade para a matemática.
Aquele verão foi bom, não é mesmo? Foi o bastante para me fazer entender aonde quero chegar, ao menos.
Fiquei sabendo os acontecimentos da Grande-cidade-Grande, aquela cinza. Depois do que aconteceu com o Canastra acho que nunca mais terei coragem de voltar, então espero que nunca percas tempo me procurando por lá. E não se engane, fiquei sabendo que te encontrastes de novo com o Rei, as notícias correm.
Essa nova cidade que cheguei parece ser boa para viver. Pequena, estradas hora de terra, hora asfaltada, hora apenas da caminhada. Vi uma casa interessante, acho que vou me aquietar nessa. Próxima de tudo que preciso, apesar de longe de tudo que... bem, você sabe, não sabe?
Talvez montar um negócio, daqueles de vida raza de núcleo de novela razoável. Apesar do que conversávamos - e do que escondia - acho eu nunca ter imaginado nada muito além disto.
O que me pesa é com tudo isto não saber aonde vais parar.
Nos encontramos em minha ida e na sua volta, quase que algo parecido com o meio do caminho para um de nós. Talvez eu tenha chego, mas fico me perguntando se conseguistes voltar, enfim.
Faz tempo desde então, não?
Às vezes acho que até mesmo esqueci alguns detalhes do teu rosto - ou dele inteiro, não fosse as fotografias que guardei em minha agenda gasta dos tempos que estive aí, e que tenho um medo incrível de jogar fora. Lembro que uma vez anotei assim:
"Como pode mudar
tanto
tudo
em tão pouco
tempo." (10/07/09)
Só não lembro a razão, os motivos. Mas acho que eu já tinha partido. Não de corpo, mas de alma; sabe?
Mas tudo bem. Se para nada mais restou do que dar-me uma bela lição, posso também perceber tudo como uma bonita história para contar para as crianças, daquelas que a gente finge inventar e que elas adoram - e torcem por alguma espécie de fim feliz que os contadores alteram o final por saberem bem demais do que estão dizendo.
Afinal,
não foi uma bela história.
Talvez nem eu tenha entendido ao certo.
Mas o que importa,
o que importa mesmo,
é que tudo que tem início,
possui algum fim.

Isso me lembra de minha avó quando tricotava um cachecol para mim:
as histórias são como um fio de lã, sabe.
Longas, longas, longuíssimas.
Parecem não terminar quando tricotamos.
Até que terminam.
E então?
É.
Acho que contam-se outras.
Ou melhor,
compra-se mais lã.


terça-feira, 24 de maio de 2011

Biografia das decisões

Decidi parar de fumar.
Decidi mudar de vida.
Decidi parar de beber, dormir tarde; quero começar a acordar cedo, cuidar do meu corpo, arranjar um trabalho novo. Decidi parar de me mudar, e me estabelecer em um mesmo endereço pelo menos por mais de uns dois anos. Decidi almoçar no horário certo, jantar em um horário certo, tomar café da manhã, da tarde; mas tudo muito saudável e equilibrado.
Decidi ter um horário fixo para o estudo, já que dizem melhorar no resultado final. Também vou frequentar mais as bibliotecas e menos os espaços virtuais. Mandar menos e-mails e mais cartas a mão. Tratar menos de assuntos importantes via chats online e falar mais cara-a-cara.
Decidi faxinar meu quarto ao menos duas vezes por semana e não comer mais na cama. Decidi que vou cuidar mais do meu jardim e que a sala de estar é para estarem as pessoas, e não mais casacos ou mochilas.
Decidi me tornar mais decidido; menos passivo diante a decisão das outras pessoas. Decidi esperar menos - mas sem me tornar menos paciente.
Decidi ir ao médico ver como está minha saúde, ir ao dentista ver como estão meus dentes - e consertar o tal que me incomoda há anos.
Decidi parar de contar o tempo. O que passou, passou, não é mesmo?
Aí decidi parar de lembrar de tudo que passou. Decidi deixar de lado tudo o que você me ensinou. Decidi me tornar um homem que Eu sempre quis.
Então decidi parar de amar; parar de depender do passado. Parar de desviar de meus pensamentos e ignorá-los de vez.
Decidi desistir de mim.

Pois bem,
tendo em vista meu descontentamento com tais decisões,
recomecei-me pelo início:
voltei a fumar cinco minutos depois.

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Da chuva

I

Há alguns meses atrás disse eu saber de que chuvas me abrigar. Pois bem, hoje digo também saber quais tempestades escolher para me banhar.
Passei todo esse tempo sem saber quais me trariam a leveza; pois bem, hoje as bem entendo. Sei da diferença entre passar frio e sentir o frio escorrendo pelos meus cabelos, incomodando meus olhos, doendo meus pulmões.
Antes eu simplesmente entendia o sofrimento e o abraçava como uma criança carente, vendo nele uma saída segura de toda loucura que a inconstante felicidade pode trazer. Hoje não a apenas entendo, mas a compreendo, e a abraço como homem - sabendo dos poréns e de seus também contratempos (que me foram uma perda valiosa de tempo).
Hoje passo frio apenas quando quero. Junto de talvez um vinho e uma boa conversa.

II

Não há nada mais libertador na vida do que desprender-se do que muitos tem medo. A chuva de ontem foi um belo exemplo.
É frio, é água; mas depois esquenta, seca. Simples.

III

Mas ainda tenho que entender que perder e vencer são antônimos somente na grafia de nossa Língua Portuguesa.
Uma vitória nunca vai suprir uma perda. A perda sempre continuará firme, talvez até do que os ganhos. O que se ganha talvez seja passageiro, um episódio. O que se perde sempre estará presente no sentido de saudade.
A perda é anacrônica. Não é do fim, nem do meio, nem do início. É de cada um.
Talvez seja meu orgulho, apenas. Mas ainda sustento esta idéia com afinco.
Você que ganhou a vida e mal reparou, já tentou experimentar perdê-la?

IV

Olá melancolia
desculpe
mas estou sem tempo até para ti.
É um certo desrespeito
e eu vejo isto
logo tu que me acompanhaste tanto tempo
me desprendo
como quem deixa de lado seu melhor amigo.
Sinto muito,
melancolia,
mas há momentos da vida
que só precisamos de tempo,
e eu vejo isto
por ter já sofrido deste mesmo despeito.
Encontraremo-nos novamente um dia,
vai ver que até mesmo amanhã,
a vida é disto:
de nunca saber o que se passa na cabeça das três irmãs.
Se elas teceram-nos um momento
hão de faltar-lhes criatividade e tecerem outro.
É uma questão de faltar de originalidade.

terça-feira, 10 de maio de 2011

Biografia do frio

Revejo anotações antigas junto de músicas antigas, junto de frios na barriga antigos, vestindo roupas antigas que me lembram perfumes antigos, que me lembram outros invernos; que me fazem pensar o quão mais frios eram os invernos antigos, mas o quão mais frio passo de acordo com os anos que se passam.
Das anotações antigas percebo uma coisa: apenas minha letra não mudou. O que penso hoje, ironicamente, era exatamente o que eu temia trilhar de raciocínio sobre a vida - que tem me parecido tão certo, tão coeso... tão... mais prático, mais fácil, mais...
Não escondo e nunca escondi a saudade que tenho de mim. De nós todos juntos também, claro. Das tardes de vida e noites de sono. Da necessidade da conquista de uns e de outros. Da saudade (e que saudades da saudade!). Mas a saudade de mim... esta sim; esta sim.

Está frio.
Preciso de mais cobertas;
meus sonhos já não me aquecem mais quanto,
nem meu pranto (que pranto?),
nem meus Santos.
Não ouço mais tuas rezas,
não ignoro mais as promessas que nunca disse
mostro cá de que que é feito a verdade:
Está frio. Pronto.
Está dita na sinceridade.
Está frio. Não estás sentindo?
- É inverno! - Dizes, em tom de defesa.
E Não, não desdigo.
Afinal,
a verdade não é de advogar casos perdidos.
Casos cegos.

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Biografia de uma conclusão.

A vida é tão maior que Dois.
O mundo é tão mais que ambos lábios.
Na estrada vejo tantos além de o que dizem sermos.
E aqui eu deveria dizer:
mas...
mas não há poréns.
Desaprendi a apenas querer
isto a que dizem ser
a que viemos.
Mas, e aqui sim, não!
Acho eu querer mais que quatro paredes e satisfações.
Já vi muito do mundo para parar por aqui e dizer:
já está bom.
Agora digo eu a que vim:
quero entender.
Apenas saber:
não.
"Mas..."?
mas não há poréns.
É isso que me ensinaram a querer:
o mundo.

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Biografia de um Canastra pacato

Há dias em que me acomete o desejo da vida pacata de servidor público de salário certo ao começo de mês. Da vida mediana.
Vou ao bar para pensar no que tenho feito, no que tenho como vida e no primeiro gole de cerveja me descem idéias erradas sobre quem tenho sido.
Olho em volta, vejo as vidas de todos engravetados que passam com suas pastas de couro, nos seus rostos tão cansados quanto os da vida minha e vejo que não há problema algum em ater-se a isto:
a vida resumida em fins-de-semana e férias anuais.
Vejo em seus dedos anelares alianças de compromisso com uma família - esposa, dois filhos, sogros, cunhados e almoços de Domingo. Enquanto isso revejo meus Domingos de ressaca moral e rostos estranhos ao meu lado. Em meus trabalhos incertos. Em minhas festas sem prazer algum.
Sem prazer algum.
Termino a garrafa e peço outra.
Termino a garrafa e peço mais uma.
Converso meias palavras com a mesa do lado, mas só queria saber as horas.
A noite está agradável e penso para onde posso ir depois daqui. Talvez mais uma das festas de prazer nulo, de rostos estranhos ao amanhecer.
Pago a conta, pego minha sensatez e coloco fones de ouvido.
Brinco com meu bom-senso de mão em mão no caminho até a casa de festas mais próxima. Entro. Entro e as luzes estão belíssimas!

Acordo com uma dor fantástica no corpo. Parece-me que dancei como ninguém. Viro para o lado e quem é que está ali? Tem beleza no rosto e no corpo, ao menos. Descubro uma rouquidão em minha voz ao tentar acordar o corpo desmaiado que repousa uma de suas pernas em cima de uma das minhas.
Meu teto parece girar. Meu estômago acaba por girar junto. Meus lábios ensaiam um sorriso.
Me sinto de volta.