sexta-feira, 6 de abril de 2012

Biografia de uma não despedida


- A vida está na capital! - já diziam os trabalhadores da revolução industrial. - Você viu, não viu? Ó no que que deu.
- Mas Maestro! Tu tens tua vida inteira aqui. Teu trabalho, tua casa, teu salário!
- Rei..., minha vida inteira está aqui.
Pegou numa mão a outra mão de fazer tremer ambas tamanha força de ambição em estar certo de suas palavras.
Um silêncio.
- Pra onde você vai...?
- Não sei ainda. Talvez eu vá até a rodoviária e escolha por lá, não pretendo carregar muito peso nas costas.
- Como não sabe, Maestro?
- E você? - fitou, então, como nunca havia fitado alguém antes.
- Eu...? - desnorteado, coagido.
- E você...? Você sabe neste exato momento para onde está indo?
E outro silêncio.
- Você me conhece, eu não sou o Cãnaã.
- Talvez esteja querendo ser.
- Tampouco sou você.
O ambiente já estava bêbado de tantas doses de silêncio.
Rei se levantou, arrumou a cadeira do bar em seu devido lugar.
- Você quem sabe.
Sem despedida, foi-se.

A cerveja havia esquentado, e a deixei ali. Pedi mais uma, acendi meu cigarro; na televisão estava passando um show de alguma banda curiosamente divertida dos anos 80. Eles estavam realmente engraçados. Engraçados de rir sozinho.
De rir sozinho.
Eu deveria começar a me acostumar com isso. Ou abraçaria a loucura.

O tempo passa mais lentamente quando você está com o copo sozinho na mesa. O gole parece que não entra, que não desce, que não faz subir a cabeça para cima; ela te faz ficar olhando o chão como se fosse o objeto mais estupendo do lugar, quando na realidade é o mais...
e eu estava já agindo Canastra.
Mas eu sei. Antes eu partir que ver ele fazer o mesmo. Uma pena não haver possibilidade de cruzar com ele no caminho.
Escolhas opostas, destinos opostos. Sua escolha, minha escolha, e respeito ambas, ainda que não estar pelo Rei seja um problema.
Nos perderemos todos, no final das contas.
É como se eu já tivesse lido isso em algum lugar.

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