domingo, 13 de abril de 2008

Sem-Bio Grafia.

- Será que era para ser assim?
- Não posso dizer de certeza, mas quem sabe...
- Foi tão derepente, tão inesperado... eu não...
- Não esperava. Não pensou que podia acontecer. Não percebeu quê.
- É, por aí.
- Entendo...

Os dias passavam lentos, sem inovações por parte do tempo. Chuva, e só. Dias encarceirados dentro de casa, esperando por um quase milagre.
- Mas é claro que o sol vai voltar amanhã - cantava -, mais uma vez, eu sei!
Quase ria de sua situação. Já lhe era algo ridículo.
Já sentia que não fazia mais sentido.
E quando não faz sentido, não tem porque seguir com o time perdedor.
O telefone demorou, mas tocou.
- Alô.
E desligaram na sua cara.
- Filho da puta - retrucou.
As janelas estavam pingadas da chuva, com riscos de água. Quase poético. Quase.
O telefone voltou a tocar, e continuou tocando. Havia saído num pulo, não aguentava mais as paredes cinzas de seu pequeno aperto. Redundância, eu sei, mas necessária.
Decidiu pelas escadas, como se houvesse outra opção. Hoje queria inovar, ter uma vida mais saudável, e desceu como se fugisse das suas regras. Não havia mais porque parar.
Mas parou, abriu a porta de saída, correu até a entrada do prédio, abriu a porteira e libertou-se: chegou àquela rua húmida pela chuva demasiadamente fina, insistente e extremamente chata. Foi à padaria, escolheu o melhor vinho - o melhor dentre os piores, afinal, ele estava em uma Padaria. Comprou também um abridor, passou o cartão e dirigiu-se à praça.
A praça estava deserta, mas lhe trazia boas lembranças. Andou, cada vez mais molhado, pelos caminhos até chegar a fonte central. Era linda, e, na chuva, os cavaleiros, espadas e cavalos tomavam vida e energia. Estavam em guerra contra o tempo, assim como está nossa personagem. Admirado, como que vendo as estátuas pela segunda, ou terceira vez. Admirado, também, ficou por ver um jovem sentado em um banco. As roupas de moleque, o jeito também."Não estou sozinho", pensou.
Sentou-se nas bordas da fonte, abriu com custo a garrafa, tomou o primeiro gole. Lembrou-se, deu-se o prazer da nostalgia, do choro, e derramou o resto do vinho dentro da fonte.
- Para você - contou à fonte. Você que sempre esteve, desde a primeira vez. Sabe, nós temos algo em comum: essa imagem imóvel de estarmos lutando, é estranho. Me sinto tão potente quanto vocês aí, de cima da fonte. Me sinto como vocês, existo. Esse vinho pode não ser o melhor, afinal, agora, quero que ele represente a minha vida. Quero que vocês sintam o preço dela. É bom até, né?
A fonte não respondeu, obviamente. Mas a personagem sentiu-se bem, apesar de tudo.

A chuva não cessaria tão cedo, mais três dias. Só mais três dias permitiu-se somente existir. Após isso, quem sabe, voltaria a viver.

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